O
LIVRO DIDÁTICO, O PILAR DA EDUCAÇÃO TRADICIONALISTA E OS
AVANÇOS DA ERA CONTEMPORÂNEA DE TRANSFORMÁ-LO EM RECURSO EDUCACIONAL
TECNOLÓGICO
Do quadro negro ao giz, do Data-show às projeções, os meios de
transmitir conhecimento se adequam aos avanços de cada época, pode-se dizer,
portanto, que estamos na era tecnológica, da qual fala Viana: “A sociedade
atual, vivencia uma realidade, onde as crianças nascem e crescem em contato com
as tecnologias que estão ao seu alcance ‘’ (2004, p. 19), assim estas novas
tecnologias estão dando acesso a conhecimentos discutidos não só por palavras,
como também por sons, imagens, vídeos, etc. Consequentemente o acesso a
educação não se dá apenas na escola ou pelo família, mas não deixam de ter um
papel significativo que é o de guiar os jovens, que vivenciam a total exposição
de informações e conduzi-los para caminhos benéficos.
Nesse sentido, têm-se hoje crianças tão
espertas e inteligentes desde cedo e já tão conectadas aos recursos
tecnológicos que passa a ser comum seus parentes mais velhos admirarem suas
desenvolturas e como os gostos mudaram, por exemplo, se antes as crianças
queriam brinquedos de presentes, hoje querem aparelhos eletrônicos . Um termo
que pode ser relacionado a essa mudança na cultura, que se deu com a chegada
dos meios de comunicação e tecnológicos, é a “Bricolagem”, termo utilizado por
Michel de Certeau em seu livro a invenção do cotidiano (1994). Esta que, se define como uma reinvenção,
incorporação de outra cultura e modificação desta. Só a era tecnológica em si
já é um exemplo de bricolagem. Ora, se ela se incorporou em uma cultura da qual
as formas de comunicação eram escassas e transformou-as em facilitadas, se
modificou e ampliou as formas de transmitir conhecimento para além da família,
do professor e dos livros, logo, houve uma modificação notória sobre outra
cultura.
A escola que por muito tempo se
consolidou como a principal instituição de educação, das formas de conduta e
dos modos para viver em sociedade, dispõe dos métodos que considera propícios
aos seus objetivos principais de: condução do cidadão, normalização ao sistema
e vivência em sociedade por meio da disciplina e ordem. Como também um agente
no direcionamento de conteúdos e informações que visualizam como
imprescindíveis para a efetivação dos objetivos citados. De forma que os
discentes através da ordem e respeito devam ser receptivos e memorizar e captar
tudo transmitido na sala de aula. Para,
além disso, utilizando-se do conceito de disciplina de Foucault do qual a
escola se enquadra perfeitamente, por se reverberar como um lugar vivenciado
por um rigoroso controle de tempo para que, esse último seja produtivo e
programado, além de uma organização do espaço e vigilância. O tempo dentro da
sala é programado por horários da ministração das matérias, há tempo para
intervalo, para chegar, para sair, para isso a escola necessita para além dessa
vigilância e controle, recursos que possibilitem lidar com o tempo segundo seus
objetivos, e qual seria o recurso que mais se adequa a tais objetivos e é
formado por divisões e que busca se adequar ao tempo do ano letivo? O livro
didático.
Voltando um pouco atrás da
sua história, o livro didático desde seus primórdios foi direcionado para
atender e guiar os professores, tendo em vista que nem sempre a formação dos
docentes fora bem direcionada. O livro nasce como uma junção de vários textos
dos quais serviria para o professor além de tudo estudar. No mais tardar, os
editores buscaram tornar os livros acessíveis aos alunos, obviamente visando
maiores lucros, e a partir do século XIX o livro passa a ser usado como um
objeto escolar e que segundo Bittencourt: “O livro foi se tornando um objeto
sacralizado, acabando por se transformar em modelo da cultura ocidental” (2008
p. 94). De fato, o livro didático é um
objeto forte que não findou diante das tecnologias e resiste a todas as tentativas
direcionadas para sua extinção. Se por um lado suas informações podem ser
transportadas em qualquer lugar e lidas a qualquer momento sem necessidade de
algo específico, por outro, as informações que podem ser obtidas nos recursos
tecnológicos necessitam de conexões de internet que nem sempre são acessíveis
em todos os lugares.
Os livros são como uma representação
política de uma conduta de conhecimento que depende da identidade dos grupos
que a produzem. Quando se fala em representação política, é possível afirmar
que os livros de história sentiram mais fortemente esse jogo de interesses
associado aos conteúdos de acordo com os interesses dos grupos do poder, haja vista que no decorrer do tempo seus
conteúdos foram amplamente reprimidos e negligenciados. Na visão de Gasparello
(2009) são delimitadas três fases que caracterizam uma política de ensino da
disciplina de história: a História Patriótica (1831-1861), caracterizando a
história como meio de formação de cidadãos patriotas, exaltando em seus
materiais: a terra, o indígena e a crítica à colonização. A segunda fase denominada de História
Imperial (1861-1900), tratada de quando a visão do colonizador muda e ganha
destaque a imagem do branco e da classe senhorial se tornando os representantes
da ‘nacionalidade’. A terceira fase é a
História Republicana (1900-1920) e consiste numa fase de renovação dos símbolos
nacionais: o índio passa a ser o guerreiro da colonização, a coroa representa o
Brasil imperial e as forças armadas passam a serem exaltadas como heróis da
república. Em vista disso, Chartier argumenta que: ‘’Os livros impõem um
sentido ao texto que carregam e buscam comandar os usos que podem ser
investidos e as apropriações aos quais estão suscetíveis. Essas ordens só se
tornam realidades quando tomam a forma física em seus textos transmitidos por
uma voz’’ (CHARTIER, 1994, p.8).
O livro didático é o objeto educacional
mais resistente ao tempo e as inovações, nem mesmo com as informações, hipertextos e vídeos que podem ser
obtidos na internet o substituíram. Mas, em contrapartida há propostas e
projetos já em andamento de transformá-lo em um recurso digital para que possa
ser acessado facilmente por intermédio dos eletrônicos. Esse intuito de
conversão do papel para o digital surgiu pela imersão do mundo digital na vida
das pessoas e não faz sentido tecnologia não alcance a sala de aula.
No Brasil,
o impulso para o investimento do governo federal se deu pela constatação
do ministério da educação que constatou justamente a carência de materiais
adequados as ferramentas tecnológicas, posto que os materiais didáticos não têm
acompanhado a adaptação das ferramentas tecnológicas para sala de aula, mesmo
com computadores, celulares e tablets
disponíveis não há materiais digitais potenciais para utilização desses
recursos. Diante da constatação da
situação pelo ministério da educação, o governo federal decidiu investir em
produções de conteúdos educacionais digitais, tais como: criação de programas
de estudo e leitura, fórum de discussão para professores e jogos digitais
voltados para aprendizagem.
Embora o mercado só tenha vindo a
começar a desenvolver a questão do livro digital recentemente, é importante dizer que, as primeiras ideias e
esboços iniciais sobre o assunto foram iniciadas em 1945 após a segunda guerra
mundial, pelo cientista americano Vannevar Bush (1890-1974). Bush desde aquela
época já sentira a necessidade de uma maior acessibilidade ao conhecimento,
para que não se desperdiçasse mais tempo em pesquisas nos livros, como também
alegava o desprovimento em novos modos de armazenar e consultar informações. Em
suma , o legado de Bush enquanto cientista foi justamente objetivado sobre
tentativas de recuperar o conhecimento feito e produzido pela humanidade.
Não obstante disso , desde 2014 o MEC incluiu no programa nacional do
livro didático a exigência que as editoras produzam versões digitais dos
livros, de maneira que esse recurso digital não seja apenas uma simples cópia
do livro impresso e pudessem oferecer outras atividades, a exemplos de vídeos,
simulados e ilustrações. Claro que nem todas as editoras dispuseram de outras
ferramentas além da cópia fiel do livro impresso. Nesse caso, cabe ao professor
fazer com que os alunos utilizem os celulares, tablets e computadores para pesquisarem e baixarem conteúdos de sua
indicação. Mas no que se refere a essa última questão citada, uma pendência é o
fator de muitas escolas ainda terem ausência de conectividade com a internet.
Partindo desse princípio é preciso a
busca por materiais offline, ou seja,
que possam ser baixados e utilizados depois, sem a necessidade de
conectividade. Em suma, é sabido que não há mais aprendizagem passiva, onde o
aluno só recebe informações sem atuar nelas, no aprendizado se prostra como
ativo e constrói novos conhecimentos a partir dos quais já possui. Na
perspectiva de Burke nos é apresentado uma distinção metafórica entre
conhecimento e informação, duas questões que parecem se entrelaçar, mas que
possuem diferentes sentidos. Segundo ele: “Informação é algo específico e
prático enquanto o conhecimento seria algo processado e sistematizado que o
autor distingue como o que é ‘cru’ e ‘cozido’” (BURKE, 2003, p. 19). Assim
sendo, o conhecimento pode ser descrito por meio de informações mas não depende
exclusivamente destas para sobreviver. Enquanto as informações podem ser tanto
práticas quanto teóricas.
Afinal, o intuito da adoção tecnológica não é
de excluir as formas de ensino tradicionais, mas fazer com que não se fique só
nelas, uma vez que a tecnologia deve complementar o papel. Mesmo o Brasil tendo
uma considerável distribuição tecnológica nas escolas, há ainda uma grande
deficiência na infraestrutura como um todo, que dificulta a utilização focada
na aprendizagem. O desafio atual com a tecnologia é fazer com que os métodos de
aprendizagem se adaptem a evolução da tecnologia educacional. Enquanto países
como Coréia do Sul , Finlândia e EUA estão investindo nessa transição para o
material digital . O exemplo citado não afirma que o Brasil não invista, mas
que, ainda tem muito a avançar, sua transição encaminha-se de forma mais lenta.
Nesse sentido, uma nova implementação híbrida está em procedência, em que o
aluno compra o livro impresso e ganha o acesso ao digital. Mas, para que o país
avance significativamente nesse novo processo, é preciso três pilares
primordiais: infraestrutura, conteúdo digital e formação de professores.
Acresce que, um dos principais
empecilhos é o despreparo dos professores, que se tornam passivos diante de
novas propostas de inovações por não terem recebido em seus cursos de formação
disciplinas específicas para a utilização de recursos tecnológicos e em virtude
disso, são despreparados para um possível trabalho com livros em forma digital,
haja vista que não debateram e nem estão preparados para questões como essas. Freire
diz: “O mundo não é. O mundo está sendo” (1996, p. 76), podemos dizer também
que o professor não é, o professor está sendo. Disso surge a consciência do
docente de que precisa estar sempre se especializando, procurando eventos e
ambientes de debates sobre assuntos atuais, tendo em mente que sua formação
profissional é continuada e nunca deve parar quando termina, pois devem estar
preparados para acompanharem as evoluções tecnológicas.
No que se refere ao conteúdo digital é
interessante ressaltar que mesmo sendo um novo rumo para o livro tradicional, o
mesmo não perdeu seus traços originais, o que acontece é que ele evoluiu e seu
processo de produção mudou. O livro eletrônico tem várias possibilidades
podendo ser promissor na disseminação e acessibilidade de informações, como
também visualizado em diferentes aparelhos eletrônicos, dentre outras vantagens
podem ser destacadas também : a leveza dos aparelhos, ajuste de luminosidade,
navegação entre os textos, marcador de páginas, economia de papel, ajuste de
tamanho e fonte e o fato de não ser
suscetível a deteriorização. Além disso, sua utilização torna o ensino mais
agradável uma vez que, a tecnologia atrai os jovens e contém a eficácia da
possibilidade de transportar vários livros sem peso algum . O leitor passa a
ter liberdade para condução de sua leitura.
Nesse mesmo ínterim , há questões inviáveis sobre o livro digital, que
se efetivam nos custos dos aparelhos digitais que são necessários para o acesso
ao conteúdo, que somado ao preço do próprio livro digital se consolidam como
altos. Outra questão pertinente é a pouca facilidade de compartilhamento, haja
vista que, algumas editoras já estão vinculando o conteúdo digital a conta do
usuário. A necessidade de recarregar a
bateria também é uma inviabilidade e não menos importante a exposição da vista
à luminosidade por muito tempo, podendo passar a tornar a leitura cansativa.
Por outro lado , outras condutas de
ensino como ensino híbrido e a gamificação estão se disseminando. O ensino híbrido busca alternar os momentos
em que o aluno estuda sozinho no ambiente virtual, quando interage em grupo com
os colegas e presencialmente com o professor. Enquanto que a gamificação, busca
potencializar o jogo como ferramenta educativa que é utilizada de forma
complementar para uma aprendizagem mais natural. Todavia, muitos pais estão se
mostrando apreensivos com essas novas propostas de estudos virtuais, e pela
substituição do livro impresso pelo digital, partindo do princípio de que se
tornará de difícil controle saber quando os filhos estão estudando ou
utilizando os eletrônicos para outros fins.
A proposta do livro
didático digital é viável e pode vir a ser um meio bastante eficaz, mas para
isso é preciso uma melhor análise de todos os eixos envolvidos para efetivação.
Em uma era tecnológica nada mais interessante do que transformar o recurso
clássico da educação em um material moderno e que seja pensado como um material
que além de oferecer conteúdo, ofereça também facilidade para realização de
atividades, simulados e até mesmo acesso a vídeos nos próprios celulares. Em
suma, um material completo, acessível para visualização e mais dinâmico que o
livro impresso.
REFERÊNCIAS:
Olivia Maria Paulino Belmino de Souza ,
é estudante do sexto período de licenciatura em história pela Universidade
Estadual da Paraíba. Atuante no projeto da residência pedagógica.
CERTEAU, M. A invenção do cotidiano I:
as artes do fazer. Petrópolis: Vozes, 1994.
VIANA, M. A. P. Internet na Educação:
Novas formas de aprender, necessidades e competências no fazer pedagógico. In:
MERCADO, L. P. L. (Org.) Tendências na
utilização das tecnologias da informação
e comunicação na educação. Maceió: EDUFAL, 2004. 228p
GASPARELLO, A. O livro didático como
referência de cultura histórica In: ROCHA, H.,
MAGALHÃES, M. de S., GONTIJO, R.(Org.) A escrita da história escolar: memória e
historiografia. Rio de Janeiro: FGV, 2009.
BURKE, P. Sociologias e Histórias do
Conhecimento: Introdução In: Uma
história social do conhecimento: de Gutemberg a Diderot. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 2003.
CHARTIER, R. A ordem dos livros: leitores, autores e bibliotecas na Europa entre os
séculos XIV e XVIII. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1994.
BITTENCOURT, C.M.F. Livro didático e saber escolar (1810-1910).
Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2008.
FREIRE, P.. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa.
São
Paulo. Paz e Terra, 1996.
Que propostas para a formação de professores em relação a estas novas tecnologias você teria, dado que não se trata somente de uma questão de conhecimento técnico do uso delas, mas também de um uso crítico dos diversos conteúdos que temos na web? E será que mais que criar um acesso digital aos livros didáticos/novos materiais não seria importante também adaptar o livro didático a este novo mundo, dado que em tantos casos ele ainda é o único livro ou contato com o conhecimento histórico que muitos alunos e suas famílias têm?
ResponderExcluir--Ingrid Requi Jakubiak
Acredito que o método tradicionalista não seja de todo ruim, porém muitas vezes a ênfase em um fato maior acaba tirando a importância de fatos menores, de pessoas menos conhecidas mas também que tiveram muito importância ao Brasil de hoje, o que fazer para possibilitar aulas mais amplas em termos de conteúdo já que os livros são bem resumidos?
ResponderExcluir