ENSINAR HISTÓRIA EM TEMPOS SOMBRIOS:
UMA BREVE REFLEXÃO SOBRE A PEDAGOGIA DO ÓDIO NAS REDES SOCIAIS
Peço licença
para começar esse texto na primeira pessoa. Será um relato de um episódio
bastante sintomático ocorrido em minha experiencia docente e em seguida
deixarei algumas impressões a partir do lugar social que ocupo como mulher,
feminista e professora de História nestes dolorosos tempos atuais, em que uma
assustadora onda conservadora têm surgido e impactando a ação de professores e
professoras deste país. Posso afirmar que minha prática educativa, iniciada há
quase 15 anos encontrou um forte obstáculo precisamente no ano de 2016, ano do
questionável impeachment sofrido pela presidenta Dilma Rousseff. Sou professora
de uma escola pública localizada no interior do Maranhão. Era início do
semestre letivo nas turmas de Ensino Médio, nível de ensino ao qual atuo. As
aulas começaram na semana do Dia Internacional da Mulher e minha aula caiu
justamente no dia 08 de março. Utilizei o espaço da aula inaugural para falar
aos meus alunos e alunas sobre a luta histórica por direitos e emancipação das
mulheres organizadas em torno de um movimento social conhecido como feminismo.
Narrei um pouco do que já conquistamos e o imenso caminho a percorrer dado os
boicotes do capitalismo e do patriarcado – uma vez que ambos são instituições
que se retroalimentam através da exploração feminina e da negação de direitos
em diversos níveis.
Deste modo, a
referida pauta foi inserida por se tratar de uma questão candente no que diz
respeito aos direitos humanos. É intencional que politizemos datas relacionadas
às lutas antirracistas e a favor das minorias excluídas historicamente em nossa
cultura, como a população negra, LGBT´s, indígenas, campesinos e mulheres. Em que pese nossas críticas, é importante
ressaltar também que os exames do ENEM (até o ano de 2018) têm sido
comprometidos com a inclusão de questões urgentes da sociedade, incorporando
temas e pautas do conhecimento produzido por esses grupos minoritários porque,
afinal de contas, somos sujeitos históricos e temos direito de acessar ao
patrimônio de saberes construídos por diferentes homens e mulheres no tempo.
Dito isto, volto
ao ponto da aula ministrada no dia 8 de março de 2016. Na sequência, passei a
receber ataques virtuais de alunos por meio de memes e postagens em redes
sociais que me consideravam uma “doutrinadora comunista fracassada” e que “não
ensinava história, apenas feminismo”. Causou-me perplexidade porque isto nunca
havia ocorrido antes. O que sabem esses jovens sobre comunismo e socialismo a
ponto de usarem tais termos como adjetivos políticos ofensivos? Por que
mencionar a luta das mulheres por direitos incomoda tanto e para eles soa como
algo “fora da história”? Por quê alunos de origem pobre e periférica têm
incorporado esse discurso conservador e autofágico, na medida que também os
massacra? Á parte das minhas elucubrações, reuni provas e tomei as devidas
providências internas para que os danos morais a mim fossem reparados (e não
foram devidamente) o que culminou em um pedido público de desculpas dos alunos
nas redes sociais, local onde a minha prática docente foi desautorizada.
Já é uma tarefa
hercúlea conseguirmos ministrar o imenso conteúdo de nossa disciplina
articulado ao cuidado de construirmos uma postura crítica e investigativa nos
alunos e alunas por meio do rigor científico e dos procedimentos da pesquisa
histórica aplicada ao ensino. Apesar das múltiplas demandas e dos nossos
esforços em meio a um cotidiano muitas vezes precário de trabalho, não passamos
para esses segmentos conservadores de “doutrinadores de jovens”. Como é amarga
a sensação de perseguição política!
Nós professores
e professoras de História comumente tratamos de temas incômodos porque também
nos é atribuída a função de lembrar aquilo que as sociedades mesmas “querem”
esquecer, porque entendemos que a memória coletiva implica em uma gestão de
poder e interesses em conflito com repercussões na forma como construímos o
presente e como abordamos o passado. De Eric Hobsbawm (1998) a Paul Ricoeur
(2007), a memória é uma arena disputada em que se amalgamam lutas políticas,
culturais e econômicas.
A simples existência de outras memórias, narrativas e
versões contra hegemônicas do passado já são suficientes para os historiadores
e historiadoras serem vistos como “inimigos perigosos” do projeto autoritário
em curso no país.
Após esse
desgastante processo, passei a ter olhos mais do que atentos para a construção
do atual aparato ideológico da extrema-direita amplamente divulgado pelas redes
sociais. Isto é, o fascismo vem batendo à porta buscando conquistar a
subjetividade de jovens e tornar um inferno a vida dos professores e
professoras da área de ciências humanas ou de quem questione o status quo. E
faz isso com enorme êxito. O projeto Escola Sem Partido é, indubitavelmente a
expressão máxima desse cerceamento ideológico e epistemológico imposto aos
docentes. Portanto, é urgente que neste cenário volátil e impreciso saiamos da
apatia pra começarmos a entender como campo progressista, o avanço e
fortalecimento de uma nova direita brasileira.
Nesse sentido,
destaco as contribuições das pesquisadoras Esther Solano (2018) e Rosana
Pinheiro-Machado (2019) que têm desenvolvido estudos e produzido algumas
respostas para tentar compreender o complexo fenômeno do ódio como política na
sociedade brasileira. E o papel das redes sociais na divulgação dessa
“pedagogia do ódio” é mais do que central, uma vez que é o ponto em que o
sistema de difusão de calúnias, inverdades e notícias falsas encontra suporte e
capilaridade. Em entrevista, a pesquisadora Esther Solano afirmou que essa nova
onda direitista que confia em candidatos de extrema-direitista os maiores cargos
políticos das nações se baseia numa espécie de “rebeldia conservadora”, isto é
“trata-se de um
grito de desabafo, de mal-estar, de descontentamento, um pouco dessa ideia
do antissistêmico,
do anti-establishment.
Por outro lado, digo que é uma rebeldia conservadora porque as pessoas não
votarão nele para que se construa uma coisa nova, de vanguarda, de futuro, mas,
sim, para voltar ao passado mais tradicional, aquele dos valores cristãos, da
ordem e da tradição, da hierarquia. Digo que há uma politização da
antipolítica, por um lado, e um discurso muito antiesquerda, antipetista,
anticomunismo, de outro. Isso mostra um descontentamento muito claro e uma
rejeição às pautas identitárias, aos movimentos feminista, negro e LGBT, que
têm crescido muito no mundo inteiro. Então há uma reação a tudo isso”
(SOLANO,p.01, 2018)
Para esta
professora, a reação às poucas conquistas que os grupos minoritários tiveram
nos últimos anos nas gestões petistas foram suficientes para acrescentarem um
clima de ódio as minorias. Os inimigos a serem combatidos passam, portanto, a
serem os professores, as feministas, os sem-terra, os sem-teto, os indígenas, a
população LGBT, isto é, qualquer pessoa ou grupo que tensione contra o projeto
neoliberal, meritocrático e fundamentalista cristão que está se
institucionalizando no coração do estado brasileiro. Até a luta por direitos
civis liberais como a manutenção do estado laico e o cumprimento da
Constituição de 1988 têm sido suficientes para credenciar uma pessoa com a
pecha de “comunista”, em uma clara tentativa de culpabilizar grupos
marginalizados em suas lutas legítimas.
A nova direita
brasileira é profundamente anti-intelectual (por isso o ataque aos docentes e
às universidades) e ultraliberal (difundindo um tipo de credo que culpabiliza
as pessoas pela pobreza e vende fartamente o discurso do empreendedorismo como
saída individual face a crueldade capitalista, porque afinal de contas “ser
rico é uma questão de escolha” como apregoam os atuais gurus das finanças que
pululam por aí). Mais do que isso, há em curso uma tentativa muito forte de
liquidar direitos e garantias sociais da classe trabalhadora por meio de uma
violenta política de privatizações das empresas estatais e de reformas
anti-povo, como a reforma trabalhista e da previdência.
Já para Rosana
Pinheiro-Machado (2019), a ascensão da extrema-direita em nosso país está
ligada a memórias e processos traumáticos que não foram suficientemente elaborados
no pós-ditadura e que acabam retornando na forma de um elogio a um passado
supostamente pacífico e ordeiro – o do regime militar em que não haveria
banditismo e minorias reivindicando seus direitos:
“O bolsonarismo
é a vitória da extrema-direita, a radicalização de uma política de ‘nós contra
eles’, cujo inimigo é interno - e não externo. Ele é uma subjetividade que só
emerge dentro de circunstâncias históricas específicas, como a nossa frágil
memória da ditadura. Tal qual na ditadura, o anticomunismo é relacionado com o reacionarismo
moral voltado às questões de gênero e sexualidade. Passamos muito tempo
pensando ‘Como o Brasil pode eleger Bolsonaro?’, mas a pergunta certa é: ‘Como
conseguimos ter 12 anos de um governo progressista, apesar de um histórico tão
violento e conservador como o nosso?’” (PINHEIRO-MACHADO, p.01,2019)
A indagação
levantada por Rosana Pinheiro-Machado é importante na medida que assistimos ao
retorno de uma forte militarização da política, em que há mais militares do que
civis ocupando pastas nos ministérios do atual governo. E se nossa cultura
comporta tais práticas, é porque existe nela uma trama autoritária enraizada no
DNA da formação da sociedade brasileira. Estamos, sem sombra de dúvidas, nos
referindo a uma ordem social do tipo patriarcal, machista, racista, classista e
homofóbica, que busca por meio do uso da violência aniquilar toda e qualquer
diferença. E este autoritarismo violento têm se travestido de uma roupagem
“pop”, humorística, isto é, o discurso fascista é transformado em linguagem de
memes, dificultando assim identificar a perversidade dos seus enunciados
(SOLANO, 2018). E infelizmente, é esse discurso que tem atingido em cheio a
subjetividade da juventude brasileira abrindo caminho para banalização e
naturalização do ódio contra as minorias. Os alunos que me atacaram
virtualmente estavam de posse dessas ferramentas comunicativas (os memes)
usadas para destruir reputações e ridicularizar posturas progressistas. De
norte a sul do país, a classe docente tem sido perseguida e atacada.
Sei que nessa
disputa, nós do campo progressista estamos ainda acumulando reveses. A direita
conseguiu colonizar as redes sociais de tal forma que uma parte significativa
da sociedade apenas se informa através dela, o que leva a um fenômeno da crise
de legitimidade das mídias tradicionais. Nesse sentido, as informações são
construídas e repassadas através da plataforma do aplicativo WhatsApp e quase
sempre se apresentam sem nenhum compromisso com a checagem de fatos ou a
credibilidade das fontes. A opinião individual tem alcançado um perigoso status
de verdade sendo muito difícil desmenti-la ou confrontá-la com informações e
conhecimentos embasados. Dito de outro modo, como os algoritmos das redes
sociais faz com que vivamos em “bolhas virtuais”, as pessoas constroem as
verdades que mais lhe apetecem e que mais endossam suas posturas políticas.
O dissenso, o
diálogo e o contraditório praticamente inexistem na lógica de mercado das
redes, o que leva irremediavelmente às ações de ataque e ameaças virulentas de
quem se sente mais confortável com o anonimato da vida virtual pra destilar
impropérios e discursos de ódio. Muito provavelmente aqueles alunos que
mencionei no início do texto não teriam coragem de olhar nos meus olhos e me
atacarem verbalmente, mas tiveram coragem de fazer isto usando de modo covarde as
plataformas virtuais como meio de aniquilação do outro. Meu “crime”? Falar
sobre mulheres no Dia Internacional da Mulher. Lutar contra a cultura do
estupro no espaço escolar. Defender a escola pública gratuita e de qualidade
para todos e todas. Insistir em uma historiografia didática que contemple as
experiências e memórias dos mais diversos grupos sociais. Como professora de
História engajada na luta pela democracia, vou sempre cometer esses “crimes”,
denunciar injustiças e apontar as desigualdades.
Como campo
progressista, necessitamos redobrar a vigilância pelos nossos direitos e pela
existência da nossa frágil e combalida democracia. Sei o quanto é difícil
convocar o coletivo que se encontra apático e atomizado, no entanto, não será
possível nenhum tipo de mudança que não passe pela sociedade organizada
disputando os espaços políticos (ruas, escolas, sindicatos, redes sociais,
igrejas) e a subjetividade da nossa juventude – que vem sendo tomada de assalto
por fantasmagorias anacrônicas e reatualizadas da Guerra Fra por meio do
suposto “perigo comunista” que de fato nunca existiu em nosso país. Temos,
portanto, a missão e obrigação de lutar sempre pelo passado, pois a memória se
encontra permanentemente em disputa.
Referências
Jeane Carla
Oliveira de Melo é professora de História do IFMA Campus Alcântara e doutoranda
em História Social da Cultura pela UFMG.
HOBSBAWN, Eric. Sobre história.
São Paulo: Companhia das letras, 1998.
PINHEIRO-MACHADO, Rosana. “É impossível separar bolsonarismo do antifeminismo"-
In: https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2019/03/01/e-impossivel-separar-bolsonarismo-do-antifeminismo-diz-antropologa.htm. (Acesso
em 04/03/2019)
RICOEUR, Paul. A
memória, a história, o esquecimento. Campinas, SP: Unicamp, 2007.
SOLANO, Esther Gallego. O ódio como política: A reinvenção das direitas
no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2018
______. “A
direita pop e a memificação da política: entrevista especial com Esther Solano”.In:
http://www.ihu.unisinos.br/159-noticias/entrevistas/583242-a-direita-pop-e-a-memificacao-da-politica-entrevista-especial-com-esther-solano. (Acesso em 04/03/2019).
Bom dia, bom pelo que eu entendi da sua publicação você quer colocar as "minorias" igual você diz, contra as "maiorias". Será que se tentassem juntar as duas ao invés de coloca-las uma contra as outras não seria melhor para toda a população? E em relação sobre a escola sem partido qual sua opinião e o que você acha que poderia melhorar para ficar bom para os dois lados?
ResponderExcluirSabrina Cavalli
Oi Sabrina, obrigada pela leitura e comentário do texto. Sobre a questão das minorias, enfatizei que a construção da extrema direita no Brasil está ligada também a uma capacidade singular em fazer com que as minorias briguem entre elas e desta forma, perdemos a força e nos atomizamos. Sobre o projeto Escola sem Partido, peço desculpas, mas não tem como "ficar bom para os dois lados" porque é impossível simetrizar os pólos desse debate. Sabemos, portanto, que o desejo é estabelecer uma visão única dos processos históricos e vigiar professoras e professores, cerceando o pensamento crítico e questionador. É um projeto que já foi até derrotado por ir contra a liberdade de cátedra docente.
ExcluirPrezada Jeane, obrigado pelo seu relato. Concordo completamente com a sua análise sobre o momento que vivemos em nosso país. Nesse cenário, acho importante que relatos como o seu sejam compartilhados para que, como professores, possamos estar atentos e cientes às realidades vivenciadas por nossos colegas em sala de aula. Mais do que nunca, a Educação vive um momento de crise e instabilidade. Para além dos já costumeiros cortes de verbas e da falta de valorização do professor, vivenciamos um momento em que relatos como o seu estão se tornando cada vez mais comum, em que os professores estão sendo atacados dentro e fora de sala de aula por apenas fazerem seu trabalho. Com a recente mudança do Ministro da Educação, temo que o projeto anti-intelectual olavista vá ganhar novo fôlego. Assim, concordo que a união do campo progressista é fundamental para enfrentar o avanço do conservadorismo retrógrado. No entanto, como proceder? Acho que compartilhar relatos sobre a realidade docente é um passo importante, mas como podemos ir além, para garantir que a sala de aula seja um espaço democrático de reflexão?
ResponderExcluirObrigada pelo pertinente comentário! Acredito que nossa união enquanto campo progressista passa por estarmos (despidos de preconceitos e com muita disposição para ouvirmos) próximos da classe trabalhadora deste país, porque consciência política não brota do chão. Deixo esse link que serve para aprofundar o debate:http://marcozero.org/o-deus-mercado-e-a-forca-do-discurso-liberal-na-periferia-brasileira/
ExcluirMuito pertinente e importante seu relato. O ódio propagado nas redes sociais já está tomando forma fora delas, quando discursos que antes só estavam na tela, agora estão se tornando ideais e fazendo parte da mentalidade e consciência das pessoas. É entristecedor que toda fala que defende a democracia e a igualdade de oportunidades, sejam tidas como falas 'comunistas' e que por isso devem ser combatidas, quando na verdade, é o mínimo que todos deveríamos almejar e lutar. Vejo que uma das maiores dificuldades é justamente mostrar que isso é o mínimo, pois muitas vezes não existe o diálogo, mas somente ataques e cortinas de fumaça, deixando de lado uma análise mais aprofundada da realidade e de ter em vista que o problema é muito maior e devastador, sendo urgentemente necessária uma tomada de consciência. Nesse sentido, como promover esse diálogo quando muitos estão mais preocupados em atingir do que refletir?
ResponderExcluirIsabelly Pietrzaki Pereira
Isabelly, obrigada pela reflexão. O "nó górdio" é justamente esse, para qual temos mais perguntas do que respostas: "como podemos recuperar o coletivo para a disputa e luta política em favor dos interesses populares"? A esquerda deve se renovar, estar mais disposta a ouvir a população nas suas demandas e aprender juntos e juntas a pautar um debate que possa recriar a política como prática coletiva e de construção de sentidos em comum. Deixo esse link para o debate: http://marcozero.org/o-deus-mercado-e-a-forca-do-discurso-liberal-na-periferia-brasileira/
ExcluirJeane,
ResponderExcluirMuito relevante suas ponderações acerca do momento político e educacional brasileiro. Em tempos de ataques nítidos à educação, pensar formar de resistências se faz extremamente necessário. Assim, quais são os maiores enfrentamentos das pessoas comprometidas com a educação no Brasil? Como podemos construir espaços de discussões em tempos de ideias como as do movimento “Escola sem partido” e dos pressupostos alardeados na caricata “Ideologia de gênero”?
Carolina Giovannetti
Obrigada pelo seu comentário! Carol, acredito que estamos bastante à deriva enquanto esquerda por vários fatores: perda da capacidade de comunicação com os setores populares, arrogância acadêmica, lutas por questões avessas à realidade da classe trabalhadora, ou seja, que não fazem muito sentido para esta. Para uma esquerda fraturada, acredito que nosso ponto de partida é ouvir mais e julgar menos. Mas ao mesmo tempo, a luta é hercúlea porque nessa correlação de forças, a direita saiu na frente já que aprendeu como ninguém a se comunicar e acolher a classe trabalhadora. Por isto gostaria de deixar o link dessa pesquisa sobre o imaginário social da periferia, que nos dá várias pistas pra tentar entender como reconfigurar nossas ações enquanto campo progressista: http://marcozero.org/o-deus-mercado-e-a-forca-do-discurso-liberal-na-periferia-brasileira/
ExcluirCara Jeane, muito pertinente o seu relato para o momento. Lamento muito pelo ocorrido com você. Mas o que eu gostaria de saber é se, mesmo com tantas diferenças ideológicas, políticas e sociais existentes em nossa sociedade, você consegue ver alguma possibilidade de, em meio a tantas diferenças, existir algum tipo de relação 'harmônica' entre "conservadores" e "progressistas" sem que quaisquer um deles deixe de lado seus ideais? Se sim, peço a gentileza de exemplificar para nós. Se não, peço a gentileza de explicar a negativa dessa "harmonização".
ResponderExcluirDesde já a parabenizo por seu trabalho e agradeço sua atenção.
Micherlando Pereira da Costa
Micherlando, política é também disputa no campo simbólico e ideológico. É embate entre visões divergentes e acredito que crescemos enquanto democracia quando é possível dialogarmos sobre projetos, ainda que sejam atravessados por diferenças. Entretanto, é impossível dentro de uma democracia (ainda que burguesa) normalizar idéias que revisionam e relativam o regime militar, que entendem que "bandido bom é bandido morto", que debocham dos números crescentes do feminicídio e da cultura de estupro, que almejam aprofundar o genocídio indígena e afins. Então acredito ser bem difícil harmonizar civilização e barbárie. A meu ver necropolítica e democracia estão em campos bem opostos.
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirBoa tarde professora,
ResponderExcluirexcelente texto, precisamos cada vez mais de vozes como a sua, que militem a a própria existência e pela dignidade de todos.
Minha pergunta talvez soe como algo mais pessoal, por conta da narrativa feita no início de seu texto, no entanto acredito que seja pertinente e faz parte do repertório que expôs aqui.
Trabalho com edição de livros didáticos e tenho presenciado constantemente desde que o novo governo assumiu, uma postura dos autores de história em alinhar os conteúdos com o pensamento proposto pelas autoridades, ainda que recaiam sobre isso os erros conceituais como no caso do golpe militar, mudar para revolução militar de 1964. O mercado e o governo ditando as regras para a propagação de conhecimentos.
Gostaria de saber sobre a desconstrução imagética que têm sido feita dos professores e pessoas ligadas à educação: a que se deve a apatia da maioria em se calar diante da desautorização e consequente difamação, ou o alinhamento com pensamentos que estão na contramão do ensino atual?
Oi Heitor, obrigada pelo comentário. Você traz uma questao extremamente relevante e urgente pra gente pensar sobre a relação complexa entre mercado editorial e as memórias em disputa. Particularmente enquanto historiadora fico extremamente desapontada com os colegas que se mostram dispostos a revisionar em suas narrativas o golpe militar de 1964 a troco de obterem a adoção e circulação de seus livros didáticos. A lógica do lucro engolindo e pervertendo a memória histórica... Isso é bem triste e politicamente grave! É um debate que temos que enfrentar. Sobre sua outra pergunta, em relação a superação da nossa apatia: certamente estamos sendo bombardeados e gastando nossa energia com as sandices diárias anunciadas pelo atual governo de modo que ficamos reféns dessa antipolítica, apenas reagindo e não propondo ações coletivas.
ExcluirExcelente reflexão, queria que o campo progressista se unisse e não ficasse nessa briga de egos que foi o que ajudou a eleger Bolsonaro. Temos que aprender com os erros e ter a plena consciência que não é um movimento exclusivamente do Brasil e que eventos parecidos aconteceram na Inglaterra (Brexit) e na eleição americana (Trump), tanto é que teve ajuda do Steve Banon, envolvido nos dois casos descritos. Gostaria de saber como você tem lidado em sala de aula em questões que envolvam "fake news" levantadas pelos alunos?
ResponderExcluirAlberto Ferreira e Souza.
Alberto, obrigada pelo comentário. Como docente, a forma com a qual trabalho com fake news é apresentando fontes de informação fidedignas e discutindo com os alunos e alunas os conceitos ligados à questão da "pós-verdade" e a extrema relativização do conhecimento que têm sido rebaixados a meras opiniões. Acredito que debater os interesses políticos por trás das notícias falsas ajuda e muito a "desarmar a bomba" e habilitá-los a um ceticismo saudável e necessário.
ExcluirMuito pertinente o texto, parabéns! Como foi bem enfatizado, devemos lutar por uma historiografia que leve em conta as experiencias e memorias de diversos grupos sociais. Porém, a construção destas "verdades" encontradas e reproduzidas nas mídias sociais é o oposto do que prega esta ideia. você concorda que uma das bases para a construção destas inverdades é parte de uma politica de negação da história? que utiliza de memórias individuais/ casos isolados para formar a opinião do coletivo? e o mais importante, como o professor pode lidar com alunos que pregam essa cultura do ódio?
ResponderExcluirLorena Raimunda Luiz
Oi Lorena, obrigada pela leitura e pelo comentário. Concordo com você sobre a questão do anti-intelectualismo que vem sendo disseminado como forma de reelaborar a memória e o conhecimento histórico na direção de interesses conservadores. O pensamento de extrema-direita precisa desvalidar a diversidade e tudo mais que o questione. O fascismo não aceitava tensionamentos. É típico de regimes autoritários o silenciamento das vozes dissonantes e a cotidianização da barbárie.
ExcluirPrimeiramente, parabéns pelo excelente trabalho!!
ResponderExcluirDe quais formas você conseguiu superar o preconceito dos alunos?
Att,
Kamily Alves da Silva
Oi Kamily, obrigada pelo comentário. Não sei se consegui efetivamente superar o preconceito dos alunos, mas acredito ser uma vitória trazer o mal-estar a tona pra que possamos discutir a respeito dele. Humanizar e politizar os alunos e as alunas é uma disputa, por vezes com revezes.
ExcluirOlá professora, gostei muito do texto e do tema abordado.
ResponderExcluirAinda pensando no contexto atual, onde cada vez mais professores da área de humanas (e principalmente de história) são desvalorizados e atacados por essa onda neoliberal e conservadora principalmente no âmbito das redes sociais, gostaria de perguntar, ou mais precisamente pedir que você comentasse, sobre o crescente revisionismo sobre fatos históricos traumáticos (Ditadura Militar no Brasil, Escravidão e Nazismo), revisionismo este baseado somente em interesses ideológicos e em um negacionismo histórico, que acabam vulgarizando e desvalorizando o conhecimento historiográfico, bem como o conteúdo aplicado pelos professores em sala de aula.
Att. Ramon Gustavo Becker
Obrigada pelo comentário! Recomendo a leitura dessa matéria: https://www.dw.com/cda/pt-br/o-negacionismo-hist%C3%B3rico-como-arma-pol%C3%ADtica/a-48060402
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirOlá, parabéns pelo ótimo texto! Sinto muito que você tenha passado por essa situação horrível, e espero que a escola tenha tomado alguma atitude para te proteger. Seu relato é muito importante para que as pessoas compreendam a que ponto o fascismo está enraizado na nossa sociedade, e como ele consegue seduzir as mais variadas pessoas. É essencial que existam mais profes como você, que não se curvam às ameaças do Escola Sem Partido e que seguem exercendo a docência com ética e com verdade. Gostaria de perguntar a você como ficou a relação com a turma após o ocorrido relatado por você (se for possível compartilhar) e que estratégias você sugere que profes que vivem algo semelhante possam adotar para se proteger. Obrigada!
ResponderExcluirAlana Thais Basso
Alana, obrigada pela solidariedade. É disso que precisamos, apoio mútuo e acolhimento. Depois desse ocorrido sinto que nunca fui a mesma em sala de aula e pra piorar, a situação política do país vem descendo ladeira abaixo. Essas questões me tocam profundamente porque vivi pra ver a minha categoria ser novamente tão perseguida e aviltada. No momento atual encontro-me de licença para estudos (por conta do doutorado) e esse tempo longe da sala de aula também tem servido para o meu fortalecimento emocional e para cuidar de outros projetos profissionais. É assim que a gente segue! Cuidemos de nós!
ExcluirBoa Noite Prof.ª Jeane Carla,
ResponderExcluirInicialmente gostaria de parabenizá-la pela coragem em publicar esse relato em um tempo que a democracia está fragilizada (embora a maioria não reconheça isso), que a sala de aula deixou de ser um local de reflexão e problematização de temáticas importantes e emergentes, pois o professor é considerado um doutrinador, capaz de influenciar negativamente os seus alunos, isto é, fazê-los pensar na ordem vigente e ideologia dominante. Há quem ainda não sentiu, mas instaurou-se um clima de apreensão nas escolas, que é preciso ter cuidado com tudo o que se fala, a forma que age, evitando "maiores problemas". Escrevo isso, pois neste ano, ao trabalhar exatamente o Dia da Mulher, com o uso de charges que representam as ideias machistas, abordam o feminicídio, papel das mulheres na sociedade nos diferentes tempos históricos e suas conquistas, fui alertada que deveria ter cautela com os argumentos. Realmente há uma ideia errônea sobre diversos conceitos, sendo repassados na mídia e naturalizados socialmente. Contudo, também não deixei de realizar minha proposta, ouvi as opiniões e dialoguei com os alunos, tendo em vista que se a escola não abre espaço para essa discussão, analisando sob outras óticas, quem irá fazer? A mídia que despeja fake news? Com certeza não. O conhecimento científico parece não valer mais nada frente as turbulências das informações que chegam pelas TICs. Por isso, quero agradecer por a senhora ter compartilhado sua experiência, pois assim não me senti "sozinha no barco". Não sei qual será o futuro, mas sem a consciência histórica estaremos fadados ao fracasso. Que não percamos as esperanças e forças!
Atenciosamente,
Laís Francine Weyh
Querida Laís, obrigada pelo comentário acolhedor. Espero que saibamos estar juntos e juntas para atravessar a maré dos tempos sombrios. O feminismo e a História das Mulheres são uma chave importante pra gente ser resistência e ao mesmo tempo renovar a discussão historiográfica. Talvez a nossa maior luta agora será contra o revisionismo e o negacionismo na História, porque esse é realmente um monstro que quer nos engolir e nos tratorizar. Espero que a gente consiga se articular por meio de associações, coletivos e sindicatos. A única coisa que tenho certeza é que essa luta é pra se lutar de mãos dadas.
ExcluirParabéns, excelente reflexao, todavia, acho que chegamos nisso, também por conta da arrrogancia de setores do campo progressista, que nao constroe alianças, mas ficam se agredindo enquanto isso a direita sempre está unida contra o inimigo.comum, parece que nunca aprendemos mesmo, isso vem se repetindo eleição apos eleição, nao vejo perspectivas de mudança deste quadro
ResponderExcluirOi João, obrigada pelo comentário. Penso que devemos fazer autocrítica enquanto campo progressista e, dentre muitas ações, repensar nossa vaidade. Te dou razão. No entanto, a hegemonia política está com a direita e na atual relação de forças, estamos tomando muito atraso. Reorganizar o campo progressista é urgente. Ou isso, ou seremos tragados por esse moinho fascista.
ExcluirParabéns, excelente reflexao, todavia, acho que chegamos nisso, também por conta da arrrogancia de setores do campo progressista, que nao constroe alianças, mas ficam se agredindo enquanto isso a direita sempre está unida contra o inimigo.comum, parece que nunca aprendemos mesmo, isso vem se repetindo eleição apos eleição, nao vejo perspectivas de mudança deste quadro
ResponderExcluirEduardo da silva vicente Júnior
ResponderExcluirótimo reflexão e como estudantes de história vemos as dificuldades de apresentar a história como ela deve ser apresentada por conta de correntes ideológicas e perseguição política, que atraso, como devemos trabalhar esse hibridismo ideológico e político em sala de aula.
??
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